Morre lentamente quem não troca de idéias, não troca de discurso, evita as próprias contradições.
Morre lentamente quem vira escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajeto e as mesmas compras no supermercado. Quem não troca de marca, não arrisca vestir uma cor nova, não dá papo para quem não conhece.
Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru e seu parceiro diário. Muitos não podem comprar um livro ou uma entrada de cinema, mas muitos podem, e ainda assim alienam-se diante de um tubo de imagens que traz informação e entretenimento, mas que não deveria, mesmo com apenas 14 polegadas, ocupar tanto espaço em uma vida.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o preto no branco e os pingos nos is a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não acha graça de si mesmo.
Morre lentamente quem destrói seu amor-próprio. Pode ser depressão, que é doença séria e requer ajuda profissional. Então fenece a cada dia quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem não trabalha e quem não estuda, e na maioria das vezes isso não é opção e, sim, destino: então um governo omisso pode matar lentamente uma boa parcela da população.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projeto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe. Morre muita gente lentamente, e esta é a morte mais ingrata e traiçoeira, pois quando ela se aproxima de verdade, aí já estamos muito destreinados para percorrer o pouco tempo restante. Que amanhã, portanto, demore muito para ser o nosso dia. Já que não podemos evitar um final repentino, que ao menos evitemos a morte em suaves prestações, lembrando sempre que estar vivo exige um esforço bem maior do que simplesmente respirar.
Martha Medeiros
Sobre a autora:
Martha Medeiros nasceu em Porto Alegre em 1961. Formada em Publicidade. Escreveu livros de poesias e de crônicas, seu mais recente lançamento é o livro de ficção: Divã. Martha é cronista do jornal Zero Hora.
Poesia apresentada no programa 97
Os poemas e os textos lidos em "Provocações” são, às vezes, livre adaptação do original, por Antônio Abujamra ou Gregório Bacic. O formato em que se apresentam escritos aqui é apropriado para a leitura em TV e não o seu formato original.
Extraído de:
9 comentários:
Morrer aos poucos é o ior tipo de morte que pode existir. bj
Querido amigo Jorge!
Morre lentamente quem não se permite a possibilidade de ser feliz, de olhar para a vida com alegria e entender que nossas atitudes, mesmo que equivocadas algumas vezes, são formas que encontramos para evoluir. Se fizéssemos tudo certo, com certeza não estaríamos encarnados em um mundo de provas e expiações.
Sendo assim, um dos caminhos rumo a felicidade é “matar” a própria morte que há em nós e que teima se manifestar em quase todas as nossas atitudes, em nossos sentimentos, em nossas aspirações, em nossas afetividades.
Que bom que a morte real, na verdade, é apenas uma passagem e por isso a vencemos. Se é assim, podemos vencer também essa morte irreal que há em nós. Vamos à luta.
Forte abraço e muita paz, querido amigo!
Ben Baruch
Amo esse texto...amo Martha Medeiros...
Um grande beijo!
Seu blog está 10!
Eliane.
Óla Jorge coma vai voce?
que linda postagem ,adorei
sou fã de carteirinha de Martha
Medeiros ,amigo passei aqui hoje
para convida-lo a passar em meu blog para buscar um lindo selinho que tenho la a sua espera com carinho
Marlene tenha um bom dia
Me ha gustado mucho, creo que utilizaré algunas de sus frases.
Saludos
Lindo texto e muito verdadeiro... Morre aos poucos quem não faz nada por si, esperando que os outros ou a vida façam por ele; tudo na vida é escolha e quem não decide, quem não age, se submete; morre quem não tem coragem de ser ele mesmo e não tem coragem de "arriscar" ou melhor, simplesmente viver a vida.
Beijinhos amigo...
Valéria
Martha fala por todos.E vc o faz por nós.
Beijo,querido!
MARTHA MEDEIROS É ÓTIMA COM AS PALAVRAS GOSTO MUITO DE LER SEUS TEXTOS E ESSE É MUITO BOM!
OBRIGADO JORGE POR NOS DAR OPORTUNIDADE DE LER ESSE TEXTO AQUI NO SEU BLOG!
BEIJO
Olá amigo, vim te dar um abração de urso, mesmo tarde da noite, e prometo que amanhã volto usufruir de cada post seu, por hora to soninho, soninho, mas eu tinha que vir te dar um abração.
com carinho
Hana
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