Martha
Medeiros
Trancar
o dedo numa porta dói.
Bater
com o queixo no chão dói.
Torcer
o tornozelo dói.
Um
tapa, um soco, um pontapé, doem.
Dói
bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua,
dói
cólica, cárie e pedra no rim.
Mas o
que mais dói é saudade.
Saudade
de um irmão que mora longe.
Saudade
de uma cachoeira da infância.
Saudade
do gosto de uma fruta que não se encontra mais.
Saudade
do pai que já morreu.
Saudade
de um amigo imaginário que nunca existiu.
Saudade
de uma cidade.
Saudade
da gente mesmo,
quando
se tinha mais audácia e menos cabelos brancos.
Doem
essas saudades todas.
Mas a
saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
Saudade
da pele, do cheiro, dos beijos.
Saudade
da presença e até da ausência consentida.
Você
podia ficar na sala e ele no quarto,
sem se
verem, mas sabiam-se lá.
Você
podia ir para o aeroporto e ele para o dentista,
mas
sabiam-se onde.
Você
podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la,
mas
sabiam-se amanhã.
Mas
quando o amor de um acaba,
ao
outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
Saudade
é não saber.
Não
saber mais se ele continua se gripando no inverno.
Não
saber mais se ela continua clareando o cabelo.
Não
saber se ele ainda usa a camisa que você deu.
Não
saber se ela foi na consulta com o dermatologista como
prometeu.
Não
saber se ele tem comido frango de padaria,
se ela
tem assistido as aulas de inglês,
se ele
aprendeu a entrar na Internet,
se ela
aprendeu a estacionar entre dois carros,
se ele
continua fumando Carlton,
se ela
continua preferindo Pepsi,
se ele
continua sorrindo, se ela continua dançando,
se ele
continua pescando, se ela continua lhe amando.
Saudade
é não saber.
Não
saber o que fazer com os dias que
ficaram
mais compridos,
não
saber como encontrar tarefas que
lhe
cessem o pensamento,
não
saber como frear as lágrimas diante de uma música,
não
saber como vencer a dor de um silêncio
que
nada preenche.
Saudade
é não querer saber.
Não
querer saber se ele está com outra,
se ela
está feliz,
se ele
está mais magro, se ela está mais bela.
Saudade
é nunca mais querer saber de quem se ama,
e ainda
assim, doer.
texto e imagem - internet
Um comentário:
Muito bom... sem retoques o texto. perfeito. Mas tenho aprendido a não ter saudades de quem não tem de mim.
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